ÀS NOSSAS AMIGAS E AOS NOSSOS AMIGOS

III
É preciso partir enquanto é noite,
Enquanto é aspiração de absoluto.
É preciso voar no vórtice das lendas, das historias antigas.
Viajar, circular, além das águas, alem do ar.
Do ar – plâncton do espaço, alimento das asas.
– casulo da luz – crisálida.
A treva que desvenda e que liberta
Com seu poder noturno a pulsação não doma
Dos planetas escuros na mais densa matéria nuclear,
Nem a noite maior das negras nebulosas.
Se as coisas do mundo se encadeiam e implacáveis gravitam
Do calor das estrelas do pesado frio derradeiro,
Por que há na infância uma doçura simples e primeva?
E as cores espectrais por que alongam
Em ruivo e moreno, em zaino e rosilho,
E na explosão reside o acontecimento de uma flor?
Água, água de chuva
– presença unânime da Queda –
Aura da esperança; sombra do castigo;
Água pesada, água de chincho
– Água da chuva –
Chuva! Cabelos brancos, cabelos frios
Dessa noite velha, dessa noite fria
Que apaga a vista, que extingue a voz.
Chuva em que vou com a alma embuçada
E o coração molhado e vazio.
Ouço os teus passos ligeiros de fantasma,
O teu fragor funesto, o teu rumor sombrio
Chuva da eterna morte!
Se é impossível voltar e possível não é perdurar
Na hora intensa da espera, no espaço da demora,
É partir!
É partir e partir para o fim das memórias...
Arcturus, Antares, Altair! Capitâneas
Dessa navegação taciturna e para sempre
E para além da verdade e grandeza da vida.
É partir e partir para o fim das idades...
Já a eterna luz com os seus dedos de rosa
Estende o azul do dia;
É partir e partir para além da saudade.
Das vinhas de orvalho instante da vindima,
Meandros matinais de frondes vaporosas
E os galos proclamando de próximo a longínquo,
Nas úmidas distâncias, o canto da aventura.
(João Denys, Rose Mary, Hana Luzia, João Pedro e Dona Sinhazinha).